O sacramento da confirmação/Crisma I
A Crisma, Sacramento da paternidade espiritual
- Os exemplos de Jesus, de Maria, dos Apóstolos, dos Profetas do Antigo Testamento.
- Há uma primeira efusão do Espírito Santo, que nos faz Filhos de Deus: batismo. É um nascimento para a vida do Espírito. Espírito filial.
- Há uma segunda efusão do Espírito Santo, que nos torna capazes de transmitir a Vida espiritual a outrem: Espírito paternal do Pai. Gerar outras pessoas para Deus.Começa-se nova vida, mais madura, mais atuante, mais responsável
Desde os primórdios a Igreja conhece ainda um outro sacramento, intimamente ligado ao Batismo, denominado Crisma ou Confirmação. Em que consiste este sacramento? Qual seu significado? Qual sua fundamentação bíblica? É destas questões que trataremos a partir de agora.
Comecemos com o Catecismo da Igreja Católica, que ensina: ”A Confirmação aperfeiçoa a graça batismal; é o sacramento que dá o Espírito Santo para enraizar-se mais profundamente na filiação divina, incorporar-nos mais firmemente a Cristo, tornar mais sólida a nossa vinculação com a Igreja, associar-nos mais à sua missão e ajudar-nos a dar testemunho da fé cristã pela palavra, acompanhada das obras”. Vale a pena, antes de mais nada, analisar estas palavras acima.
São ditas duas coisas importantes a respeito da Confirmação: ela aperfeiçoa a graça batismal e é o sacramento que dá o Espírito Santo. Ora, será que a graça batismal é imperfeita? Mais ainda: o Batismo já não nos deu o Espírito? Não é no Espírito do Cristo ressuscitado que fomos mergulhados no santo Batismo? Além do mais, como já expliquei na introdução aos sacramentos, todo e cada sacramento nos dá o Espírito Santo e somente no Espírito pode haver sacramento! Então, como compreender estas afirmações do Catecismo?
Afirma-se que a Crisma aperfeiçoa a graça batismal no sentido de torná-la madura, plenamente desenvolvida. Vejamos bem. No Batismo nós recebemos o Espírito do Cristo ressuscitado; ele nos é dado como vida divina, vida nova, vida eterna que faz de nós uma nova criatura. Procure reler tudo quanto dissemos sobre isso ao expor o sacramento do Batismo. Ora, esta vida não é algo estático, parado, congelado; como toda vida, ela vai crescendo sempre mais em nós, vai nos configurando cada vez mais ao Cristo Jesus. O sacramento da Confirmação é o sacramento que leva esta vida recebida no Batismo à sua maturidade. Na Crisma o Espírito que nos tinha sido dado como vida, nos é dado como força divina, força que nos dá a capacidade de testemunhar Jesus, de anunciar o Evangelho e assumir ativamente nosso lugar na Comunidade eclesial. Por isso mesmo diz-se que a Confirmação confirma o Batismo! Não é que este seja incompleto e necessite ser completado; o sentido é outro: a Confirmação nos dá a graça da maturidade cristã, de tal modo que a vida nova recebida no Batismo pode e deve agora, com a Crisma, ser testemunhada e transbordada para os outros com a graça deste sacramento. Em outras palavras: enquanto no Batismo a vida recebida é graça que nos renova e transforma, na Confirmação esta mesma vida é dom que devemos testemunhar e partilhar! Por isso mesmo o crismado deve estar consciente do seu lugar na Comunidade eclesial e do seu dever de testemunhar o Cristo sendo, como se diz, um soldado de Cristo!
Aqui convém eliminar logo um mal entendido. Em geral se afirma que a Confirmação é o sacramento da maturidade cristã e confirma o Batismo porque recebemos este quando criancinha e aquele quando jovem que já sabe o que quer. Não é bem assim! A maturidade que a Crisma nos dá não é a maturidade psicológica; é a maturidade espiritual. Em outras palavras: se uma criancinha for batizada e crismada seu “organismo espiritual”, sua estrutura cristã já recebeu a maturidade!
Então, que fique bem claro: a Confirmação nos concede uma graça distinta do Batismo. Sem este sacramento não há maturidade na vida cristã! Por isso mesmo, rigorosamente falando, todo aquele que assume qualquer trabalho na Comunidade deve ser crismado!
Há ainda uma outra distinção importante no modo de agir do Espírito no Batismo e na Confirmação. No Batismo o Espírito nos é dado como Espírito que tornam o Pai e o Filho presentes em nós, fazendo-nos, assim, templos da Trindade. Na Confirmação, ao invés, o Espírito dá-nos algo que é próprio dele como Terceira Pessoa da Trindade: a força, a coragem, o ânimo, o vigor, a doçura para testemunhar o Senhor Jesus. A fé da Igreja exprimiu isso muito bem com a imagem dos dons do Espírito!
Agora podemos entender porque o Catecismo fala, no texto acima citado, numa mais profunda incorporação a Cristo: é que com a Confirmação o Espírito nos une ao Cristo na sua missão de sacerdote, profeta e rei, para que nós sejamos na Comunidade eclesial e no mundo continuadores de sua missão.
Vamos apresentar as seguintes afirmações:
(1) O sacramento da Confirmação é de instituição divina, enquanto sinal eficaz do dom do Espírito, prometido no Antigo Testamento e doado por Cristo na sua ressurreição. Este Espírito, Cristo o concedeu à sua Igreja e ordenou-lhe comunicar a todos os que nele cresses. Assim, o Santo Espírito é força que transforma aqueles que pelo Batismo foram lavados e renovados em Cristo Jesus, o Ungido (= Cristo, Messias) por excelência. O Cristo, pleno do Espírito, derramou seu Santo Espírito, dando início, com a sua morte e ressurreição, ao tempo da Igreja, que é tempo do Espírito Santo – é o Espírito quem sustenta, orienta e motiva a Igreja na sua missão de testemunhar o Senhor Jesus diante do mundo. Se no Batismo recebemos o Santo Espírito como vida de Deus que nos vem pelo Senhor Jesus, é pela Confirmação que este Espírito nos é dado como força de Deus para que assumamos na Igreja e com a Igreja nosso papel de testemunhas de Cristo! Por isso mesmo a Confirmação é o sacramento da maturidade cristã, já que nos faz participantes da missão de Igreja como testemunha e anunciadora do Cristo!
(2) Neste sentido, podemos e devemos dizer que a Confirmação aperfeiçoa (leva a uma nova maturidade e plenitude) a graça batismal, já que a vida recebida no Batismo transforma-se aqui em força que nos faz ocupar nosso lugar na comunidade eclesial e no empenha como cristãos diante do mundo. Daqui a afirmação do Concílio Vaticano II: “Pelo sacramento da Confirmação vinculam-se mais perfeitamente à Igreja e recebem especial vigor do Espírito Santo: ficam assim mais seriamente comprometidos como testemunhas verdadeiras de Cristo a difundir e defender a fé, por palavras e por obras” (LG 11).
(3) É errado pensar que a Confirmação é necessária porque fomos batizados ainda crianças e, portanto, é necessário confirmar conscientemente o nosso Batismo. É importante recordar que na Igreja antiga (e ainda hoje nas Igrejas Orientais) a Confirmação é dada à criança logo após o Batismos e juntamente com a Comunhão. Assim, a criancinha, apesar de psicológica e humanamente imatura, é já maturada do ponto de vista da ontologia da graça, isto é, de sua estrutura espiritual. Além do mais, quando a Igreja batiza adultos, os confirma imediatamente após o Batismo, na mesma celebração. A Confirmação é necessária porque nos dá o Espírito de força para ocupar efetivamente nosso lugar na Igreja. Deste modo, ninguém deveria receber um ministério, uma tarefa na Comunidade antes de ser crismado! Rigorosamente, para ser catequista, leitor, acólito, evangelizador, para casar-se (belo serviço de testemunho do amor entre Cristo e a Igreja) e até para receber a Eucaristia deveria ser exigido o sacramento da Confirmação. Como os leitores podem observar, aqui há muito que pensar sobe nossa prática pastoral!
(4) O rito essencial deste sacramento é a unção com o óleo do Crisma, consagrado pelo Bispo na Missa do Crisma da Quinta-feira Santa, simbolizando o dom do Espírito Santo, e a imposição das mãos, que ainda que não sendo o gesto mais importante, é extremamente significativo e, por isso mesmo, sumamente recomendável: os cristãos nela reconhecem, desde os Atos dos Apóstolos, um sinal do dom do Espírito Santo.
(5) O ministro originário da Confirmação é o Bispo. E isto tem um sentido profundo: se o Confirmado recebe a força do Espírito para assumir seu ministério na Comunidade, é extremamente significativo a presença do Bispo, Pai e Pastor da Comunidade eclesial. O encontro pessoal do que vai ser crismado com o Bispo coloca em evidência e sublinha o compromisso pessoal do confirmado, dentro da comunidade eclesial concreta, representada pela pessoa do Sucessor dos Apóstolos. Neste sentido o Bispo deve ter o máximo cuidado de estar pessoalmente presente para administrar este sacramento, somente em último caso delegando a um sacerdote esta missão, originariamente episcopal. Caso contrário corre-se o sério risco de um esvaziamento do sentido do sacramento. Não esqueçamos que a Igreja latina separou a administração da Confirmação da administração do Batismo exatamente para que o Bispo pessoalmente pudesse confirmar!
(6) Um problema seríssimo, e que ainda não está resolvido satisfatoriamente, é a ordem na qual os sacramentos devem ser administrados. Não é nada boa a ordem atual: Batismo-Eucaristia-Confirmação. A ordem tradicional e que melhor exprime o sentido dos três sacramentos é Batismo-Confirmação-Eucaristia. Com isso, aparece clara a ligação entre Batismo e Confirmação e também o fato de a Eucaristia ser a plenitude a vida do discípulo de Cristo e o cume da iniciação cristã. Não tem muito sentido receber a Eucaristia, plenitude da vida cristã e da união com o Senhor Jesus e, somente depois, receber a Crisma. É a Eucaristia, sacramento do Corpo de Cristo, quem nos dá a força para atuar no Corpo de Cristo que é a Igreja. Quem não tem seu lugar no Corpo de Cristo não pode comungar no Corpo de Cristo! Ora, para isso, é necessário estar crismado com a força do Espírito Santo! Esperamos que a Igreja encontre o quanto antes uma melhor ordenação pastoral para estes três importantíssimos sacramentos da iniciação cristã.